RESPONSABILIDADE NA CRISE DA AGRICULTURA
JOÃO DE SCANTIMBURGO
Bauru, 21 de fevereiro de 1960 – Neste país “essencialmente agrícola”, no qual os centros demográficos ocupam uma área reduzida de seu território, na sessão legislativa de 1959 não foi aprovada uma só proposição visando a agricultura. O ilustre presidente Kubitschek proclama aos quatro ventos da nação, que está fazendo o Brasil saltar cinquenta anos em cinco, expressão que é, cientificamente, um barbarismo, mas não se preocupa com a agricultura, que é, como todos sabem, a base de toda a prosperidade.
Falo com vários agricultores desta zona; alguns deles, autênticos fazendeiros, desses que moram na fazenda, que trabalham nela, que correm as suas lavouras a cavalo e de jeep, fazendeiros dessa raça que vai desaparecendo, substituída por outros, postiços, que cultivam café, algodão, cereais, criam gado, nos escritórios da rua 7 de Abril, 15 de Novembro, Boa Vista, ou nos salões do Jockey Club, e visitam as lavouras de teco-teco, em dia de sol, das 11 horas ao meio dia.
Todos apresentam numerosos problemas ao debate amistoso que travamos, enumerando, em regra, as injustiças que o poder público pratica, o abandono em que se encontra o mundo rural, as iniquidades que se abatem contra a atividade agrícola. Os problemas da produção, dos transportes, da comercialização, de trabalhador rural, da saúde do homem do campo, do físico, que explora, sobretudo, o produto agrícola, o problema das distancias que se tornam maiores, com as dificuldades de comunicação, são tantos dos que os genuínos fazendeiros suscitam nas conversas que com eles mantenho.
Tudo é difícil, no campo brasileiro. O caboclo é desprezado pelo poder público. Um dos poucos esforços sérios, de governo, posto na elevação da produtividade agrícola, é o do Plano de Ação do Governo, iniciativa do sr. Carvalho Pinto. Mas esse só não basta; é preciso mais, é preciso que o mundo rural seja salvo dos tecnocratas, dos burocratas, dos falsos fazendeiros, numa palavra, da conspiração que funciona à perfeição no Brasil contra o legitimo fazendeiro, o povoador de desertos, o cultivador dos vastos espaços vazios, o produtor. Esta é uma das mais ricas regiões do Estado. A chuva me impede de aceitar alguns convites, e visitar fazendas. A terra está pegajosa e lisa, os automóveis atolam, mas a natureza parece manifestar a sua alegria, sob o banho de água, que lhe cai, sem parar, há alguns dias.
Tem o brasileiro o hábito da volubilidade. Essa é uma das razões por que a agricultura no Brasil sofre tamanhos reveses. Mas, os tecnocratas, os burocratas, e os políticos, sem tirocínio para o exercício de cargos públicos, nem experiencia para as funções de mandato, esses concorrem com a maior parte, para o atraso da nossa agricultura, para o desanimo do agricultor, para a exploração do homem do campo, não raro de maneira ignóbil. Deve-se fazer uma revolução no campo, mas não será só com uma reforma agraria, como a que se prega nas épocas eleitorais; deverá ser contra a mentalidade dos falsos fazendeiros, dos fazendeiros postiços, que também ajudam a obra negativa do enfraquecimento das estruturas rurais do Brasil.
Diz Werner Sombart, com espírito europeu, que o fazendeiro em geral se liga amorosamente à terra, o que, acrescenta, não se dá com o industrial. Ninguém tem amor, exemplifica, a uma fábrica de ácido sulfúrico, mas ama a sua propriedade rural. O grande autor de “O apogeu do capitalismo” não conheceu os fazendeiros do Brasil, esses que encaram a terra, exclusivamente, como empresa econômica e objeto de especulação. No capítulo da crise da agricultura, tem responsabilidade a política, o regime, a democracia de clientela, de bacharéis e de aventureiros eleitorais, mas a têm, igualmente, os maus fazendeiros.
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