segunda-feira, 16 de agosto de 2021

QUANDO O GOSTO PELO PODER CONTAGIA

Vejo amigos por aqui perplexos com os 229 votos de deputados favoráveis ao voto impresso, muitos deles que teoricamente fazem oposição ao governo. Não se espantem, a matemática é simples, a conta, fácil de fazer: Bolsonaro liberou 1 bilhão de reais em emendas para comprar a manutenção de sua história da carochinha de que a maior parte da população queria o voto impresso.

Perdeu, mas não tão feio. Caiu de pé. Com mais esta bizarrice, Bolsonaro obteve apoio de 45% dos deputados presentes à votação. Só pra lembrar, 1/3 já é suficiente para impedir o processo de impeachment e o cara conseguiu mais ao colocar no centro da pauta política uma não-questão, fazendo uso, como de praxe, de mentiras, falsificações, declarações golpistas com o objetivo final de liquidar a democracia do país, culminando naquela parada militar ridícula, fonte de descrédito explorada por toda imprensa internacional.

Na realidade a base de Bolsonaro é uma gelatina e com o desastroso índice de quase 60% de rejeição nas pesquisas como candidato à reeleição não resta alternativa ao chefe do executivo que não governa, fazer barulho e se manter como firme aliado das FFAA brasileiras para se perpetuar no poder, o que me faz lembrar a operação Beco sem saída da década de 80, exposta no período da redemocratização, quando Bolsonaro teve a intenção de explodir quartéis para colocar a culpa na esquerda.

Hoje o motivo é parecido, e diante dos conflitos atuais, dos processos que o cercam, Bolsonaro retoma a polêmica sobre o papel moderador das FFAA, afirmando ter apoio militar total às suas decisões. A tese do tresloucado presidente foi rebatida por decisão do STF que assentou que a “missão institucional das FFAA é a da defesa da pátria, na garantia dos Poderes Institucionais e na garantia da lei e da ordem que NÃO ACOMODA o exercício de poder moderador entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”. Ainda de acordo com o ministro Luiz Fux, que concedeu uma liminar a uma ação do PDT para esclarecer as atribuições dos militares, de acordo com a Constituição Federal, a chefia das FFAA, que cabe ao Executivo, É PODER LIMITADO, excluindo-se qualquer interpretação que permita sua utilização para intromissões no independente funcionamento dos outros Poderes. Ou seja, esse papel moderador foi abolido em 1988, com a Carta Magna, lei máxima do país que traça os parâmetros do sistema jurídico e define os princípios e diretrizes que regem a organização e funcionamento de sociedade democrática.

Hoje ninguém mais se engana. Se já não cabe aos Comandos Militares cuidarem da segurança pública, muito menos é seu papel o de governar. Em nenhuma democracia madura do mundo isso acontece. Pelo contrário, em países sérios, democráticos são muito bem definidas as linhas que separam as FFAA e o governo de plantão, uma vez que se trata de instituições de Estado.

Os comandantes das três forças que aí estão, se fossem sérios, teriam publicamente cortado as asas do presidente em qualquer referência feita por ele a possíveis manobras “fora das quatro linhas da Constituição”, ainda que no plano mais delirante das ideias para agitar seu “cercadinho" ou sua base ideológica. Exemplos não faltam para comprovar que embarcaram numa aventura política, apoiando os arroubos autoritários do chefe do executivo, inclusive se manifestando em áreas que absolutamente lhe dizem respeito. O resultado não será outro, a não ser uma marca vexatória na história das FFAA brasileiras.

E o mais triste, cada malfeito apagará a imagem construída pós-redemocratização do país e o protagonismo que os militares tiveram na política externa, quando participaram de iniciativas conjuntas com o Itamaraty visando à proteção geopolítica do Brasil na América Latina e no Oeste Africano, elevando o seu status junto à ONU ao liderarem missões internacionais de paz. Hoje o que assistimos é a associação direta a um governo que conduz uma diplomacia medíocre e subserviente cada dia mais isolada da geopolítica internacional, principalmente com a eleição de Joe Biden.

Assistimos também mais de 6 mil militares ocupando cargos civis dentro do Governo, ausência de profissionalismo, a corrupção solta nas mais diversas áreas e patentes militares, equipamentos obsoletos e pouca eficiência para defender os 25 mil km de fronteiras, sendo 10 mil marítimos.

A única resposta que consigo imaginar a tal “im” postura das FFAA é a influência orçamentária obtida com a liberação de 115 bilhões este ano e os generosos vencimentos concedidos a militares para aceitaram fazer parte desta palhaçada – alguns deles superando a casa dos 100 mil reais mensais, como no caso dos Generais Heleno, Braga Netto e Luiz Eduardo Ramos.

Resta-nos esperar que os militares, ao menos, assegurem a realização do pleito eleitoral de 2022, bem como o respeito ao seu resultado, seja ele qual for, haja vista a criminosa agitação já iniciada pelo presidente e seus pares para tumultuar o processo político e as próximas eleições.

PS. Tive que alterar o texto e a foto porque o anterior teve censura prévia do Facebook. E durma com um barulho deste! Vai vendo!

Texto: Ana Lucia Vacchiano

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